Título
original: Cidadão Boilesen
Lançamento:
2009 (Brasil)
Direção:
Chaim Litewski
Duração:
92 min
Gênero:
Documentário
‘Cidadão Boilesen’ é um documentário que
se utiliza de diversas técnicas audiovisuais desenvolvidas ao longo da história
do cinema. Há imagens de arquivo, documentos com voz over ressaltando as partes
relevantes ao documentário, além de entrevistas com jornalistas, militares,
políticos, familiares, amigos e pessoas que de alguma forma participaram da
vida do personagem principal, o já falecido Henning Albert Boilesen.
Pode-se dizer que as entrevistas geram a verdadeira cara do documentário, com a
presença de informações aparentemente contraditórias quanto ao caráter de
Henning. De um lado temos o depoimento do filho – Henning Boilesen Jr. – que
ainda acha que o pai é um herói e toda essa história é uma grande ficção, em
seguida temos o depoimento do Carlos Eugênio da Paz, que foi militante do MRT e
conta como fez parte dos planos de execução do empresário. Usando os subgêneros
dentro do documentário exemplificado por Bill Nichols, o classificamos como um
documentário participativo. O filme quer mostrar uma perspectiva mais ampla e
histórica e para isso usa a entrevista. “A entrevista permite que o cineasta se
dirija formalmente às pessoas que aparecem no filme em vez de dirigir-se ao
público por comentário com voz-over. No documentário participativo, a
entrevista representa uma das formas mais comuns de encontro entre cineasta e
tema.” (NICHOLS, Introdução ao Documentário, 2006).
O diretor desse filme foi Chaim Litewski, que em
entrevista ao site ‘cineclick.com.br’ conta que já conhecia os rumores sobre o
Henning desde 1968, quando o viu em entrevista na extinta TV Tupi, e o mesmo o
intrigou de tal forma que continuou pesquisando ao longo dos anos. A idéia
inicial era escrever um livro, porém este já havia sido lançado na Dinamarca –
país de origem do Boilesen – resolveu continuar pesquisando e criar um
documentário, pois sempre achou essa história muito parecida com ficção. Ele
conta ainda que o Coronel Carlos Alberto Brilhante Ulstra se recusou a gravar
uma entrevista, e se disponibilizou apenas a responder as perguntas e
enviá-las. Como essa foi a primeira vez que o Coronel deu um depoimento sobre a
Operação Bandeirante e falou sobre o Boilesen, o diretor quis usar a
entrevista, então pediu a outra pessoa para ler as respostas e acrescentou ao
filme.
Chaim Litewski conclui a entrevista falando: “Como diretor, não
quero dar respostas ou indicar o que é certo ou errado, mas, na medida em que o
documentário oferece um leque de visões, opiniões, conceitos e memória sobre a
época discutida, eu certamente espero que auxilie o espectador interessado em
um entendimento maior sobre o período em questão. Espero também o filme que
sirva de ponto de partida para que se estude mais profundamente esse tema. Para
mim isso já seria uma grande vitória.” (LITEWSKI, em entrevista ao site
cineclick.com.br)
As entrevistas, sem dúvida, guiam o filme. Mas um
documentário apenas com isso seria monótono e não chamaria tanta atenção.
Assim, para gerar um contraponto e ajudar na reflexão do publico, há cenas de
filmes de ficção, que são inseridas como que para ilustrar o que estava
acontecendo na época no Brasil.
O filme que é usado principalmente para ilustrar
a morte do personagem é o “Pra Frente Brasil”, que é de 1982, ou seja, foi produzido
em plena ditadura, por Roberto Farias. Esse filme é uma ficção cuja história
fala sobre o que está acontecendo com o Brasil enquanto a população está
prestando atenção nos jogos da copa do mundo de 1970. É interessante notar nesse
filme como as referencias as militares são mínimas e não há uniformes dos
mesmos em nenhum momento do filme. O único ‘coronel’ que aparece no filme está
apenas com uma roupa verde, quase da mesma cor que os uniformes do exercito. O diretor Roberto Farias aparece no filme ‘Cidadão
Boilesen’ contando como quis fazer um filme que não sofresse censura, porém no
dia seguinte da estréia, este foi censurado. Ainda nessa entrevista, nos conta
que o nome do empresário no filme “Pra Frente Brasil”, que se recusa a ajudar o
Antonio Fagundes a encontrar seu irmão e confessa ajudar financeiramente a
tortura, foi baseado no nome do Boilesen, assim qualquer semelhança não foi
consciência. Ele conta que mesmo na época já existia os rumores e ele quis
fazer uma ‘homenagem’. Celso Amorim, na época presidente da EmbraFilmes, e a
pessoa que aprovou o financiamento do filme “Pra Frente Brasil”, diz em
entrevista no filme “Cidadão Boilesen” que teve que renunciar ao cargo assim
que o primeiro filme foi ao ar, em 82.
Para se diferenciar dos outros documentários,
Chaim ainda faz uso da leitura da peça “Sonata Tropical”, do dramaturgo Roberto
Elisabetsky. Os atores Paulo Betti e Tuna Dwek que realizam essa “ficção”
dentro do documentário. Essa peça tem como temática a intervenção dos
empresários na época da ditadura justamente para deter as lutas armadas. A peça
foi escrita depois da experiência do dramaturgo, que estava passando pelo local
onde aconteceu o assassinato do empresário.
Durante todo o filme percebemos duas visões de
mundo, uma que denuncia o personagem, chamando-o de torturador, financiador da
ditadura e outras coisas, mas em seguida permite-se entrevistas com pessoas
como o filho, amigos próximos ou representantes de empresas americanas que
defendem suas ações como necessárias para manter “a paz no país”. Percebemos
que na primeira metade do filme o personagem é mais simpático, uma criança
normal, um cara que atingiu seus objetivos vindo ao Brasil e se tornando
diretor de uma empresa tão grande e poderosa como a Ultragás – maior empresa de
gás do Brasil à época. Já na segunda metade do filme, somos apresentados a um
lado mais obscuro do personagem, as ‘provas’ que levaram a resistência o
colocar na lista e posteriormente assassiná-lo.
A imagem de Henning está sempre sendo contraposta
durante todo o tempo no filme. Uma das entrevistas mais interessante é com a Helga
Mohr uma arquivista do arquivo municipal de Fredericksenberg que abre o boletim
da época de colégio e mostra como ele era apenas mais um aluno regular. Ainda
tinha uma observação nesse boletim, só mostrada na segunda metade do filme, em
que ele teria participado de um incidente durante o tempo escolar. Foi um caso
simples, que chamou a atenção do professor o suficiente para reportá-lo e leva
o espectador a pensar se desde criança ele já não era um tipo de torturador.
Durante todo o filme a imagem de Boilesen é
construída e desconstruída como um mito, um pessoa além do seu tempo, um
sociopata que tortura pessoas.
Um contraponto bem forte nesse filme é entre o
Carlos Lamarca, um ex-capitão do exercito que desertou e virou um líder da
resistência a ditadura, e o Boilesen, um empresário estrangeiro, que vem ao
Brasil, assume um cargo importante em uma empresa de base no país, financia a
ditadura militar chegando a participar e trazer equipamento para facilitar a
tortura. Esses dois personagens são vistos e colocados como opostos nesse
filme. Percebendo nas entrelinhas, vimos como Lamarca era o herói da
resistência, enquanto Boilesen era um sociopata, com um grande lado negro.
Há ainda no filme a presença de propagandas
militares e músicas da época, sempre com imagens contrastantes. A música é para
levantar o astral do povo, e as imagens são da polícia acabando com as
manifestações. É possível perceber que o cineasta queria produzir um filme o
mais neutro possível, permitindo a fala de várias partes envolvidas, porém
percebemos também que o caráter de denuncia acaba prevalecendo.
Durante o filme é deixado claro que o Boilesen
era apenas um nome no meio de muitos outros, ou seja, sem o apoio do
empresariado da época, seria impossível para os militares darem o golpe e se
manterem no poder por tanto tempo.
Bibliografia:
- http://www.cineclick.com.br/entrevista/carregar/titulo/chaim-litewski-exclusivo/id/208 • Acesso em : 5 dez. 2011
- http://www.paradoxo.jor.br/2010/01/cidadao-boilesen.html • Acesso em : 5 dez. 2011
- http://www.cinepop.com.br/criticas/cidadaoboilesen_101.htm • Acesso em : 5 dez. 2011
- http://pt.wikipedia.org/wiki/Pra_frente,_Brasil • Acesso em : 5 dez. 2011
- http://www.vermelho.org.br/tvvermelho/noticia.php?id_noticia=121254&id_secao=29 • Acesso em : 5 dez. 2011
- http://cinema.virgula.uol.com.br/entrevistas/a-ditadura.html • Acesso em : 5 dez. 2011
- http://pt.wikipedia.org/wiki/Carlos_Lamarca • Acesso em : 5 dez. 2011
- http://cineweb.com.br/filmes/filme.php?id_filme=2927 • Acesso em : 5 dez. 2011
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NICHOLS, B. Introdução
ao Documentário. 2006 Editora Papirus.
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